Sempre almejando a sabedoria e mais ainda a verdade, Agostinho de Hipona passou por diversas experiências filosóficas, desde seu materialismo racionalista, passando pelo ceticismo, até sua substituição por uma concepção espiritualista. Porém, nunca negou a existência de Deus. Estas experiências fizeram com que o filósofo cristão amadurecesse bastante, inclusive no que diz respeito às Sagradas Escrituras, que passou a compreender de forma mais significativa e profunda.
Em princípio, Agostinho havia se integrado à seita Maniqueísta, uma doutrina persa que pregava a existência de dois polos equivalentes e em permanente luta no universo: o Bem e o Mal. Perceba que segundo esse modo de pensar, além de existirem, isto é, possuírem realidades concretas, esses elementos têm o mesmo valor ou a mesma força. Assim, os cristãos representavam os adeptos do Bem e os pagãos e bárbaros, os do Mal.
No entanto, foi no neoplatonismo que Agostinho percebeu a existência das coisas incorpóreas, reorientando sua busca em um sentido transcendente. Segundo interpretações de Platão, o Mal não existe enquanto entidade, só o Bem como ideia ontológica por excelência. O Mal não é uma realidade, é um juízo e uma ação errôneos por ignorância. A partir daí, Agostinho verificou que todas as coisas são boas, porque são obras de Deus e que o Mal é culpa da forma como utilizamos o livre arbítrio. Mas verificou também que todos buscam a felicidade e o Bem (pensamentos semelhantes aos de Sócrates!). Eis, então, o problema: como reconhecer o Bem e a felicidade? Agostinho constatou, pois, que a felicidade somente se encontra em Deus, o Bem Supremo, e que nós temos esse conhecimento em nosso íntimo, de forma confusa.
Desse modo, Agostinho estabelece uma ordem de perfeição, uma graduação ou distinção dos seres para alcançar esse conhecimento que nos levaria a uma vida beata. O corpo é mortal e a alma é seu princípio de vida. Esta distinção vai dos seres inanimados e passa pelos vegetais, animais até o homem. Mas não termina aqui. Acima da razão (do homem) ainda há verdades que não dependem da subjetividade, pois suas leis são universais e necessárias: as matemáticas, a estética e a moral. Só acima destas está Deus, que as cria, ordena e possibilita o seu conhecimento, que deve, agora, ser buscado na interioridade do homem.
Nessa ordem e por um processo de interiorização e busca, pode-se encontrar essas verdades porque Agostinho admite que Deus as ilumina, estando elas já anteriormente em nosso espírito. A doutrina da Iluminação divina caracteriza-se por uma luz que não é material e que se atinge quando do encontro com o conhecimento da verdade para que o homem possa ter uma vida feliz e beata. O lembrar-se disto, isto é, o recordar-se de um conhecimento prévio é o que o filósofo/teólogo denomina de rememoração de Deus (herança da teoria da reminiscência platônica).
Agostinho teve, portanto, muita importância para a consolidação da Igreja. Isto porque em um momento de crise sobre posições divergentes, o seu pensamento evidenciava a necessidade de conciliar razão e fé, utilizando a filosofia como um instrumento que esclarecia ou explicava a relação do homem com Deus, ainda que nesta devesse prevalecer a fé. Também porque isso auxiliava os interesses da Igreja com relação à conversão dos pagãos ao invés de lutar contra eles, ampliando o número de propagadores da fé. E, assim com uma relativa estabilidade, a Igreja poderia expandir-se ainda mais, buscando o seu ideal de universalidade e comunidade em cristo.
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