domingo, 27 de maio de 2012

Sobre o Estado - Filosofia do Direito de Hegel.



Se a razão – como diz Hegel – “é a certeza consciente de ser toda a realidade” e a verdade reside apenas no todo, as partes se tornam racionais à medida que participam do todo de forma consciente. O Estado para Hegel é um todo ético organizado, isto é, o verdadeiro, porque é a unidade da vontade universal e da subjetiva. É, como entende o referido autor, a substância ética por excelência, significando com isso que Estado e a constituição são os representantes da liberdade concreta, efetiva.
O direito estatal externo repousa sobre relações entre Estados autônomos. Contudo, o Estado para Hegel é o que é em-si e para-si e, portanto, tem a efetividade de sua universalidade ou totalidade plena. Esta totalidade refere-se à união do espírito objetivo e o espírito subjetivo em que o indivíduo tem sua realidade e objetividade moral sendo parte do todo ético. Dessa forma, o indivíduo tem uma relação jurídica para com o Estado, isto é, tem um tribunal acima de si que realiza o direito enquanto liberdade. Mas as relações entre estados, diz Hegel, não são da mesma natureza que as dos indivíduos em sua vida privada e o Estado: sendo cada Estado uma totalidade em-si e para-si, sua vontade reside na particularidade para a qual se volta (substância ética, o povo). Daí que, não havendo nada acima do Estado, a relação entre os Estados se dá na forma do contrato e do respeito mútuo. Um Estado precisa ser reconhecido por outro para que tenha sua legitimidade absoluta.
Verifica-se que tal consideração sobre o Estado mostra-o, em sua individualidade, no estado de natureza. Isto nos leva a compreender que se não há acordo entre as vontades particulares dos Estados em meio a uma disputa, esta só pode ser resolvida com a guerra. A guerra, para Hegel, é legítima, pois além de ser considerada transitória (porque contém em si a possibilidade da paz), ela também é válida para a saúde moral dos povos, renovando a vaidade dos bens e coisas temporais.
Assim, fica de certo modo evidenciada a pouca simpatia do filósofo pela criação de um Estado mundial. Para que isto fosse possível, seria necessário que houvesse um acordo unânime entre todos os Estados de tal forma que prevalecesse a vontade universal, o que, segundo Hegel, dificilmente ocorrerá porque as considerações desta organização sempre repousariam sobre uma forma de contingência, isto é, sobre princípios de uma vontade particular.
Entretanto, o problema é: se o Estado é a razão efetivada, as contradições em seu interior não levariam à superação deste, já que a lógica de Hegel sempre prevê uma síntese? Mesmo que a razão não leve ao seu contrário, as contradições no interior do Estado serviriam somente para aperfeiçoar as suas instituições, uma vez que “a história universal é o progresso na consciência da liberdade” e o Estado, conforme Hegel, é o fim (télos) da história? Além disso, ainda conforme a sua lógica, não deveria Hegel ter concebido uma organização mundial, um todo pleno (assim como preferiu um Estado a uma coleção anárquica de indivíduos) do que uma coleção de Estados anárquica?
Portanto, são essas as principais questões com relação ao direito estatal externo hegeliano. O que se evidencia é a possibilidade de que Hegel teve um momento de sua particularidade, que pode ter seu contraste no fato de que, na juventude, idolatrava Napoleão e desprezava a Prússia, mas, em adulto, foi um servidor fiel do Estado prussiano. Se verdadeiramente há um progresso da liberdade na consciência, por que este não se dá a nível cosmopolita, restringindo-se a um espírito objetivo de um povo e, com isso, de vários povos, não sendo, portanto, universal? Hegel vê o Estado em sua multiplicidade de relações exteriores, sem nenhum fundamento que as justifique ou as legitime senão o acordo contratual entre os Estados visando, cada um, o seu bem-próprio. Em caso contrário, dar-se-á a guerra que, como já vimos, é até benéfica e devidamente justificada.

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